Fevereiro 2025

Três meses em Buenos Aires (novamente)

Como fiz há dois anos, passei três agradáveis meses na capital da Argentina. Terra de Borges e Cortázar, de Gardel e Piazzolla, de Maradona e Messi. Meu plano era relaxar, e foi exatamente o que fiz.

Há sempre uma guerra entre dois monstrinhos dentro de mim. Eu invariavelmente quero visitar aquelas ruínas fora da cidade, ou saltar de museu em museu no mesmo dia, ou caminhar dez quilômetros fotografando novas paisagens. Esse é meu primeiro monstro: curiosidade. Mas ao mesmo tempo eu não quero fazer nada disso, preferindo ficar atirado num bom sofá lendo um livro, ou na frente da tv tomando vinho, ou simplesmente jogando no computador. Esse é o meu segundo monstro: preguiça. Durante estes meus anos de nomadismo, tenho deixado a curiosidade vencer quase todas as batalhas. Mas neste verão em Buenos Aires, a preguiça esteve no controle.

No meu confortável apartamento no bairro Palermo, li quatorze livros
(J.L. Borges de novo, Philip K. Dick, Samuel Beckett, Julian Barnes, Han Kang, e um punhado de autores chineses), assisti muitas horas de séries de tv (incluindo todas as oito temporadas de House MD, mais uma vez), e joguei novamente o velho RPG Darklands.

Também fiz dois cursos de literatura no Museo de Arte Latinoamericano de Buenos Aires (MALBA). O primeiro foi Literatura China del Siglo XX, onde aprendi sobre vários autores de quem nunca tinha ouvido falar (Lu Xun, Ba Jin, Ding Ling, Wang Meng, Wang Xiaobo, Can Xue, entre outros) e dois que já tinha (Gao Xingjian e Mo Yan, ambos vencedores do Nobel Prize). O segundo foi Las Trampas de la Memoria, conectando a obra de J.L. Borges com autores como Philip K. Dick, Samuel Beckett, e Julian Barnes).

Sim, isto é o que eu considero um período relaxante.

Por que os gansos atravessaram a rua?

E nada de museus?

Claro que fui a museus. O MALBA, meu preferido, tinhas exposições de Tunga (brasileiro), Cao Fei (chinês), Frida e Diego (mexicanos), mais as habituais 220 obras de artistas latinoamericanos na coleção permanente. No Museo Sívori eu vi arte contemporânea selecionada para o 68º Salón de Artes Plásticas Manuel Belgrano, que foi bem interessante. O Museo de Arte Moderno tem uma boa coleção de modernismo argentino. O Museo Larreta é a casa onde viveu o Enrique Larreta. Ele foi escritor, diplomata, colecionador de arte, e também famoso por ter sido indicado dez vezes ao Nobel Prize sem nunca ganhar. No pequeno Museo Casa Carlos Gardel aprendi um pouco sobre a voz de Mi Buenos Aires Querido e Por una Cabeza, entre tantos outros celebrados tangos. E eu sempre gosto de ir ao Museo Xul Solar e ver seus trabalhos mais uma vez. Ele foi amigo do J.L. Borges e tinha um estilo único influenciado pelo surrealismo e por ideias místicas. Ele também inventou jogos (como o Non-Chess) e idiomas (como a Pan Lingua).

Barreras Melódicas, de Xul Solar

E a comida?

A grande surpresa que tive na Argentina foi o custo de vida. Enquanto algumas coisas continuam acessíveis (vinho e transporte, por exemplo), outras descontrolaram-se (roupa e comida, por exemplo). O delicioso e barato ojo de bife que há dois anos custava $15 USD continua delicioso mas agora custa $35 USD.

Este cenário inflacionário me obrigou a reconsiderar minhas escolhas gastronômicas. Em vez de comer carne em quase todas as refeições, como fiz da última vez, agora optei por uma dieta mais variada (e mais barata). Claro que devorei os tradicionais bife de chorizo, ojo de bife, vacío, e entraña, mas só em ocasiões especiais. Para as refeições rotineiras, frequentei restaurantes que oferecem menu del día e comi coisas como carré de cerdo a la criolla (porco assado com cebolas e pimentões), pechuga al verdeo (peito de frango grelhado com molho de alho-poró), e albodigas con pure (almôndegas com purê de batatas). Tudo acompanhado de vinho Malbec, claro.

E depois de Buenos Aires?


Na próxima semana vou para Willemstadt, capital de Curaçao.

Bida ta dushi! (Isto é "a vida está boa" em papiamento, a língua falada em Curaçao.)
 
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